Nos dois últimos números da Comunicação & Educação dedicamo-nos a mostrar como se desdobram nos textos poéticos determinados processos de apropriação intertextuais e interdiscursivos . Falamos , então , das recorrências entre Eduardo Alves da Costa , Martin Liemöller e Bertold Brecht . Acerca dos dois primeiros, fizemos comentários e arrolamos textos; sobre o último, reservamos esta edição da revista .
Eugen Bertold Friederich Brecht ( Bertold Brecht ) , nasceu na cidade alemã de Ausgsburg , na Baviera , em 10 de fevereiro de 1898 , e morreu em 14 de agosto de 1956 , em Berlim . Dramaturgo , poeta teórico do teatro , agitador de ideias , Brecht é considerado um dos mais importantes teatrólogos do século XX, com peças que marcaram profundamente a história do teatro , entre elas: Na selva das cidades , A exceção e a regra , Mãe Coragem , O círculo de giz caucasianio , Galileu, Galilei .
Por volta de 1924 o jovem Brecht mudou-se para Berlim , onde começaria profícua carreira teatral , inicialmente como assistente de dois dos mais celebrados diretores da época , Max Reinhardt e Erwin Piscator . Estando vinculado às ideias de esquerda , Bretch chocou-se com a trajetória ascendente do nazismo , tendo que se exilar em países como a França , Dinamarca , Finlândia e Estados Unidos - onde permaneceu entre 1941 e 1947 . Acusado de atividades antiamericanas , retornou a Alemanha , fixando-se, definitivamente em Berlim Oriental , onde fundou o Berliner Ensemble ,grupo que promoveria significativas experiências com a linguagem teatral e que levou à cena as últimas peças escritas por Brecht.
Ocupado em dar continuidade à ideia de que só há conteúdo revolucionário se existir forma revolucionária e vice-versa , ele desenvolveu a teoria do teatro épico-dialético , que se opunha de maneira frontal ao teatro dramático , de fundo aristotélico,considerado pelo autor de Galileu Galilei como um mecanismo dramaturgo que gerava ilusão da realidade , reduzindo , em consequência , a capacidade crítica do espectador . A teoria brechtiana propunha o chamado de distanciamento , através do qual caberia evidenciar os processos cenográficos , mostrando as estratégias que envolveu os diversos elementos que entram na economia geral da peça ; com isso , o objetivo era de ao mesmo tempo quebrar a ilusão do real e intensificar a percepção crítica do espectador , colocando-o diante dos desafios ideológicos e políticos propugnados pelo texto teatral.
A poesia de Brecht não alcançou a dimensão de grandiosidade das peças teatrais , contudo ela também possui importância pelo caráter anti-sentimental ,combativo e mesmo didático . Tanto nos textos que compõem O livro da devoção caseira
( Die Haupostile ) , de 1927 , quanto em Poesias de Svendborg ( Svendborger
Gedilchte) , de 1939 é perceptível a mesma preocupação com o efeito do estranhamento , traduzida em poemas de alto envolvimento político , desdobrado em temas como a resistência à barbárie , a luta pela justiça social , a denúncia da alienação e o engajamento em acontecimentos sociais . Em uma palavra , segundo a compreensão de Brecht , poesia e revolução social devem caminhar do mesmo lado .
POEMAS DE BERTOLD BRECHT
Os que lutam
Há aqueles que lutam um dia ; e por isso são muito bons ;
Há aqueles que lutam muitos dias ; e por isso são muito bons ;
Há aqueles que lutam anos ; e são melhores ainda ;
Porém há aquele que lutam toda a vida ; esses são os imprescindíveis .
O analfabeto político
O pior analfabeto é o analfabeto político .
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos .
Ele não sabe que o custo de vida , o preço do feijão , do peixe , da farinha , do aluguel , do sapato e do remédio dependem das decisões políticas .
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política .
Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta . o menor abandonado , e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista , pilantra , o corrupto e lacaio dos exploradores do povo.
PRIVATIZADO
Privatizaram sua vida , seu trabalho , sua hora de amar
e seu direito de pensar
É da empresa o seu passo em frente,
seu pão e seu salário .
E agora não contentes querem ,
privatizar o conhecimento , a sabedoria ,
o pensamento , que só à humanidade pertence .
Um homem pessimista
Um home pessimista
É tolerante .
Ele sabe deixar a fina cortesia desmanchar-se na língua
Quando um homem não espanca uma mulher
E o sacrifício de uma mulher que prepara café
para seu amado
Com pernas brancas sob a camisa
Isto o comove .
Os remorsos de um homem que
Vendeu o amigo
Abalam-no , a ele que conhece a frieza do mundo
E como é sábio
Falar alto e convencido
No meio da noite .
Como se percebe deste conjunto de poemas , eleva-se a temática social , política , de chamamento à consciência e à participação dos cidadãos . Podemos dizer que se cria um ambiente discursivo preocupado com a comunicação com os leitores e que recolhe e expande diálogos com outros textos de poetas nutridos pelas temáticas evidenciadas por Brecht . É neste quadro de contaminações interdiscursivas que filiamos Eduardo Alves da Costa , Martin Niemöller e Bertold Bretch .
Fonte - Revista - COMUNICAÇÃO & EDUCAÇÃO - págs 109,110 ,111 e 112
Maio/ Agosto 2007 Ano XII - N. 2 - Revista do Curso de Gestão
Adilson Citelli , Professor livre-docente no Departamento de Comujicações e Artes da ECA-USP e chefe do Departamento de Comuicações e Artes
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