Não pense que Ivo Pitanguy conviveu apenas com o grand mond. Sim , ficou amigo de Tom Cruise, Miick Jager, Michael Caine e Jimmy Carter. Mas também esteve ao lado de figuras simples - não menos importantes - como Chico Xavier e Madame Satã. O primeiro trabalhou como caseiro da família do médico, em Belo Horizonte. Nem Pitanguy, se lembrava disso até que, em 2002, foi chamado à casa do líder religioso, em Uberaba. Chico queria lhe contar da gratidão que tinha pelo seu pai. Apertou com firmeza a mão de Pitanguy e disse: “Seu pai está conosco. E quero lhe dizer que foi a primeira pessoa que me deu crédito. Trabalhei para ele na chácara da Mangabeira, onde comecei a receber pessoas para ajudar".
De Madame Satã ficou amigo por acaso. No fim dos anos 40, durante um plantão, Pitanguy cuidou de seis policiais que apanharam do travesti, que levou o grupo ao hospital e avisou: “Doutorzinho, eu os trouxe para você“. Na década de 70, os dois se cruzaram na Ilha Grande quando o médico foi até a região fazer caça submarina. A partir de então, sempre que ia à ilha, Madame Satã o levava em sua canoa para mergulhar. - Sempre tive muita curiosidade sobre as pessoas mais simples.
Mágico. Esta é uma palavra que aparece recorrentemente no vocabulário de Pitanguy e que pode traduzir a sua história. Em seu livro, “Viver vale a pena“ ( Casa da Palavra ), que tem prefácio por Nélida Piñon, ele cita o adjetivo 11 vezes. O momento é mágico. O dom é mágico . Os recantos são mágicos.
SÊNECA E EPICURO
O sobrenome Pitanguy, que se transformou numa espécie de grife da Medicina, é de origem indígena e significa “rio das crianças“. Foi incorporado ao nome de sua família por seus antepassados, numa homenagem aos índios que viveram em Minas Gerais.
O professor - como todos o chamam - nasceu em Belo Horizonte, em 1926 (ele afirma ). Mas seu pai o teria registrado no ano de 1923. Pitanguy considera sua data oficial de nascimento a que o deixa mais velho.
- Prefiro acrescentar idade, as pessoas acham que você está muito melhor.
Em BH, ele teve uma infância cercada de animais e livros. Seu mais exótico bicho de estimação foi uma jibóia.
- Adorava andar com a cobra enrolada no pescoço e pegar o bonde, que viva lotado. Todo mundo descia e eu ficava com o bonde só para mim - lembra.
Gisela, sua filha e braço direito na clínica, lembra de ver o pai diversas vezes chegando da mata nas casas da Gávea e de Itaipava com cobras enroladas em cabos de vassoura.
- Ele não tinha medo. Mas a mãe gritava, tinha pânico – conta a médica.
Ivo foi criado numa família que cultuava a leitura. Baudelauire, Cervantes e Machado de Assis fizeram parte de sua infância a ponto de ele saber de cor poemas que eram recitados repetidamente por sua mãe. Até hoje os três autores estão entre os seus prediletos. Todas as noites o médico lê por duas horas antes de dormir e, durante a madrugada, quando acorda, lê por mais uma hora. Dedica-se a autores que valorizam o presente, como Pierre Hadot , Sêneca e Epicuro.
Pioneiro na abordagem da cirurgia plástica reparadora como especialidade complementar – a disciplina não existia no Brasil quando se formou em 1946 - ele se mantém discretíssimo quando o assunto são as celebridades que operou. Mas sabe-se que passaram por suas mãos nomes como Sophia Loren, NIKKI Lauda, Marisa Berenson e Ursula Andress. Na entrevista, a única paciente que ele reconheceu ter operado foi a cantora Dóris Monteiro – a expressão “nariz de Pitanguy“ ( arrebitado ) teria surgido depois dela.
- Fui dos primeiros a mostrar que todos têm o direito de corrigir algo que não agrade em sua imagem. E sempre fiz o nariz parecer normal, não um nariz operado - explica. – Na época, a cantora Dóris Monteiro ficou com um nariz que encantou Assis Chateaubriand. Ele ficou felicíssimo.
Gloria Maria, sua amiga, diz que ser discreto e não se vangloriar foi uma das muitas coisas que aprendeu com o professor - além de um creme mágico para a pele ( uma mistura caseira de Bepantol , Hipoglós , Arovit e Vitamina E ) .
- Sou amiga de top models, e quando elas encontram o professor, só faltam ajoelhar - conta Glória. – O que me encanta é que a beleza ainda o surpreende . Ele não se acostuma com ela.
Fonte - Jornal O GLOBO - Ela - pág 2
Sábado , 13/09/2014 Editora - Ana Cristina Reis
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