terça-feira, 25 de outubro de 2016

Ensino de qualidade, um sonho antigo não realizado



Sociedade

Um ensino público de qualidade, abrangente e com valorização de professores é sonho antigo no país. As demandas atuais, constantemente na origem de manifestações de professores e alunos, vêm, pelo menos, do início do século passado. No dia 28 de março de 1932, O GLOBO  publicou uma matéria sobre o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova no Brasil, assinado por intelectuais como Anísio Teixeira, Lourenço Filho, Roquete Pinto e Cecília Meirelles. Dirigido ao povo e ao governo, o documento destacava a importância de se resolver os problemas do ensino no país e elencava necessidades que, quase um século depois, ainda aparecem como metas do Plano Nacional da Educação  (PNE), aprovado no Congresso no ano passado. 
Na hierarchia dos problemas nacionaes, nenhum sobreleva em importância e gravidade ao da educação. Nem mesmo os de caráter econômico lhe podem disputar a primazia nos planos de reconstrucção nacional“, disse o manifesto, logo em suas primeiras linhas exatamente como reproduzido no jornal da época. Em seguida, o texto faz uma crítica: “Se depois de 43 annos de regime republicano, se der um balanço ao estado actual da educação pública no Brasil, se verificará que (...) não lograram ainda crear um systema de organisação escolar a altura das necessidades modernas do paiz“.

O documento expressa a necessidade de dar aos professores "formação e remuneração equivalentes que lhe permitam manter, com eficiência no trabalho, a dignidade e o prestígio indispensáveis aos educadores". A antiga demanda continua não atendida.

Segundo uma das 20 metas estabelecidas pelo PNE, até junho deste ano o Brasil deveria ter 100% dos professores da educação básica com ensino superior completo. Em 2013, o percentual ainda era de 75 %. Outro objetivo do plano é, até 2020, garantir que o rendimento médio dos professores da educação básica seja equivalente ao das demais profissões com nível universitário. Em 2013, professores recebiam, em média, apenas 57 % do verificado na média das demais carreiras.

Ao voltar os olhos para o passado e vislumbrar as demandas dos educadores que confeccionaram o Manifesto pela Educação Nova, especialistas dizem que o Brasil perdeu o  bonde da História ao nunca dar prioridade à educação.

- O manifesto é de 1932  e, de lá para cá, os problemas continuam os mesmos sem solução. Provavelmente, daqui  há 50 anos também serão os mesmo. Com toda certeza, a educação ainda não é o objetivo de primeira ordem das autoridades do governo de modo geral  - comenta o educador Arnaldo Niskier.

O ensino integral, outro desejo dos 26 intelectuais que assinaram o manifesto em 1932, é um gargalo até hoje. Tanto que o PNE  estipula que 25 % dos alunos da rede pública devem estar estudando em tempo integral  até 2024. Hoje, o percentual é de 12 %. A tão sonhada universalização do ensino para todos os brasileiros em idade escolar, reivindicada tanto na carta de 1932 como no plano nacional em vigor, é outro desafio. Segundo dados oficiais, 2,9 milhões de crianças e adolescentes de 4 a 17 anos ainda estão fora das salas de aula.

Niskier é cético em relação às propostas atuais para reverter tudo isso. Para ele, em comparação com o manifesto, o PNE  tem pouca credibilidade
- O manifesto foi assinado por educadores aclamados; O Plano Nacional é produto de anônimos, destinado ao fracasso, porque antes dele deveria existir uma política educacional.
Para o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, apesar de cada documento ser fruto da sua época, as demandas parecidas revelam o atraso do Brasil. De acordo com ele, na ocasião, o país perdeu a oportunidade de acompanhar um movimento internacional de valorização da educação:  - O manifesto tem muitos méritos, mas é fruto de uma  época. Naquele momento não existia a possibilidade de construção de um documento que envolvesse todos os setores sociais, como aconteceu com o PNE. Ainda assim, é um documento avançado, que o Brasil não teve a capacidade de tirar do papel. A gente perdeu o bonde da História, porque a educação nunca foi prioridade. Outras nações, que na época tinham documentos até menos avançados, conseguiram implementar a agenda da educação pública de qualidade. Nós  não. 
Presidente da Associação Brasileira de Educação ( ABE ) à qual pertenciam muitos dos signatários do documento, João Pessoa de Albuquerque acredita que o problema extrapola as fronteiras do poder público. Não valorizar a questão é, na opinião dele, um problema cultural da sociedade como um todo:
- A força cultural é tão forte que muitas vezes leva um país não dar prioridade à educação. Desde 1500 nunca a colocamos em primeiro lugar. A grande marca do manifesto era exatamente a universalização do  ensino; a escola nova é uma escola que deveria abrir suas portas para todas as classes socioeconômicas, e isso infelizmente ainda não aconteceu.

Fonte    -   Jornal    O  GLOBO    pág 14     Domingo  ,  31/05/2015     
 ACERVO     O  GLOBO    O  Manifesto da Educação  , divulgado em 1932 



CECÍLIA  MEIRELLES  
Vida  -  “Entre  o  Efêmero e o  Eterno"

A própria  Cecília Meirelles nos conta de seus primeiros contatos com a vida e a morte.
Nasci aqui mesmo no Rio de Janeiro, três meses depois da morte de meu pai, e perdi minha mãe antes dos três anos. Essas e outras mortes ocorridas na família acarretaram muitos contratempos materiais, mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a Morte que docemente aprendi essas relações entre o Efêmero e o eterno  ( ... ) . Em toda a minha vida nunca me esforcei por ganhar nem me espantei por perder. A noção ou sentimento de transitoriedade de tudo é o fundamento mesmo da minha personalidade."

Aqui, a presença  da  “área mágica da infância“: 
“Minha infância de menina sozinha deu-me duas coisas que parecem negativas, e foram sempre positivas para mim: silêncio e solidão. Essa foi sempre a área de minha vida. 
Área mágica onde os caleidoscópios inventaram fabulosos mundos geométricos, onde os relógios revelaram o segredo do seu mecanismo, e as bonecas o jogo do olhar. Mais tarde, foi nessa área que os livros se abriram, e deixaram sair suas realidades e seus sonhos, em combinação tão harmoniosa que até hoje não compreendo como se possa estabelecer uma separação entre esses dois tempos de vida   unidos como os fios de um pano.“ 

Estudou canto e violino. Formou-se professora. Em 1919, publicou sua obra de estréia  - Espectros. Empenhou-se na carreira universitária e na renovação da Educação, tendo organizado a 1ª Biblioteca Infantil do país.
Entre 1934 e 1935 esteve na Europa , a convite do governo português. Em 1935, o suicídio do marido força-a a ampliar as suas atividades de professora e jornalista, para educar as filhas.
Em 1938 seu livro de poemas  Viagem, publicado no ano seguinte, é premiado pela Academia  Brasileira de Letras. Em 1940 casa-se novamente, agora com o professor Heitor Grillo. Inicia-se um período de intensa atividade profissional e literária e de freqüentes viagens ao exterior: Estados Unidos, México  , Argentina, Uruguai e mais tarde  Ilhas dos Açores, França, Bélgica,   Holanda ( onde escreve os Doze Noturnos de Holanda  ).
Em 1953, após anos de minuciosa pesquisa histórica vem à luz o Romanceiro da Inconfidência. Pouco depois parte para a Índia, onde toma parte de um simpósio sobre Gandhi. Desse contato com o Oriente surgem os Poemas Escritos na  Índia e parte das crônicas de Giroflê, Giroflá, além de Elegia a Gandhi, traduzida em várias línguas. Conhece ainda a Itália  , Israel e Porto Rico.
Em 1958 acompanha a edição de sua Obra Poética. Publica ainda outros livros  , falecendo em 1964, em plena atividade literária . Em 1965 a  Academia concede-lhe  , “post-mortem“ o Prêmio Machado de Assis, pelo conjunto de sua obra.  É a consagração definitiva do projeto que norteou toda a obra de Cecília Meirelles
                         
“Acordar a criatura humana dessa espécie de sonambulismo em que tantos se deixaram arrastar.  Mostrar-lhes a vida em profundidade. Sem pretensão filosófica ou de salvação -  mas por uma contemplação poética afetuosa e participante.“ 

Obras:
(A) Poesia

Espectros  (1919 )
Nunca mais  ...  e Poema dos Poemas  ( 1923  ) 
Baladas para El  - rei   ( 1925 ) 
Viagem  ( 1939 )
Vaga  Música  ( 1942 ) 
Mar Absoluto ( 1945 ) 
Retrato natural  ( 1949  ) 
Amor em Leonoreta ( 1952 ) 
Doze Noturnos de Holanda e Aeronauta ( 1952 )
Romanceiro da Inconfidência ( 1953 )  
Pequeno Oratório de Santa Clara ( 1955 ) 
Pistóia , Cemitério Militar Brasileiro ( 1955 ) 
Canções  ( 1956 ) 
Romance de Santa Cecília ( 1957 ) 
A Rosa ( 1957 ) 
Metal Rosicler ( 1960 ) 
Poemas Escritos na Índia  ( 1962 ) 
Antologia Poética ( 1963 ) 
Ou isto ou aquilo  ( 1965 ) 
Crônica Trovada da Cidade de San Sebastiam ( 1965 ) 
Poemas Italianos  ( 1968 ) 

B ) TEATRO

O menino Atrasado  (1966 )

C) FICÇÃO 

Olhinhos de Gato ( s/d )

D) PROSA POÉTICA
  
Giroflê , Giroflá ( 1956 ) 
Evocação Lírica de Lisboa ( 1948 ) 
Eternidade de Israel  ( 1959 ) 

E ) CRÔNICA 

Escolha o seu sonho ( 1964 ) 
Inédito ( 1968 ) 

Considerações Gerais 
A) É a representante mais característica da vertente espiritualista ou intimista do Modernismo. Cecília parte de um certo distanciamento do real imediato e dirige os processos imagéticos para a sombra, o indefinido, o sentimento da ausência e do nada. Nas palavras da própria Cecília : “ a poesia é grito , mas transfigurado “ . A transfiguração se faz no plano da expressão.

B ) É herdeira do simbolismo, retomando aspectos temáticos e formais dos simbolistas  ( é sensível a aproximação a Alphonsus de Guimarães ). É uma poesia de “desencanto e renúncia, nostalgia do além e mística ansiedade". A fuga, a fluidez, a melancolia, a serenidade  , os tons fumarentos de nebulosidade impregnam toda a sua obra.

C ) Há três constantes fundamentais: o oceano, o espaço e a solidão. Trabalhando elementos móveis e etéreos, povoados de fantasias  - forma, som e cor, o poeta projeta a desintegração de si mesmo ou busca seu próprio reconhecimento.

D ) Expressa uma visão própria do mundo, através de um intenso cromatismo, de associações sensoriais  ( o visual – auditivo = sinestesia  ), da musicalidade, do misticismo lírico, do culto da beleza natural e da preferência pela abstração.

E ) Vale-se, de preferência, do verso curto, de ritmo leve e ligeiro, que acompanha a fluência  de impressões vagas, esbatidas.

A primeira coisa que nos chama atenção em Cecília  Meirelles, e que nos prova aliança íntima de sua poesia à música, são os títulos de seus poemas. Vejamos os seguintes exemplos de títulos, em Viagem: “Música“, “Serenata“, “A Última Cantiga“, “Canção“, "Cantiguinha“, “Som“,  Guitarra“, “Pausa“, “Valsa“, “Noturno“, “ Realejo” , “ Cantiga“, “ Cantar “, “ Marcha“, “ Assovio “.

É igualmente expressivo o título de uma das primeiras poesias da coletânea: “Música“, em que as estrofes são tercetos breves, de versos de 4 sílabas e cujo ritmo se assemelha a uma cantiga rudimentar, onde as rimas vão se sucedendo ora entrelaçadas, ora misturadas:

“Noite  perdida 
Não  te  lamento 
Embarco  a vida 
No  pensamento 
Busco  a  verdade 
Do  sonho  isento"


Fonte    -   Coleção Sistema de Métodos de Aprendizagem   - OBJETIVO 
Livro  27    - Andrade  T . Teixeira , 1940





Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe seu comentário sobre a postagem.