PALEONUTRIÇÃO - DIFERENTES TÉCNICAS REVELAM O QUE COMIAM OS HUMANOS PRÉ-HISTÓRICOS
As populações humanas do passado coletavam, plantavam, caçavam, criavam e comiam grande variedade de animais e plantas, muitos dos quais já nem existem mais. Entretanto, os homens e mulheres pré-históricos não deixaram registros escritos sobre o que gostavam ou encontravam para comer, ou se eram desnutridos ou obesos. Então, como os pesquisadores descobrem o que se comia há milhares ou milhões de anos?
Diferentes técnicas são empregadas com esse objetivo. Uma delas é a análise de dados bio químicos de restos encontrados em artefatos como vasilhas e pote usados para guardar os alimentos. Pólen de diferentes plantas e grãos de amido, por exemplo, podem ser retirados de copos e penelas de cerâmica com milhares de anos. O amido é particularmente importante, porque partes das plantas ricas nessa substância, como as sementes, eram, com frequência, armazenadas em recipientes de barro. O pólen também é valioso porque algumas culturas usavam flores como alimento e condimento, e em geral os grãos de pólen são de difícil degradação.
Outra técnica utilizada é a análise dos dentes de indivíduos enterrados. Estudos de sambaquis (depósitos de conchas e outros materiais feitos por populações pré-históricas) brasileiros vêm revelando grande quantidade de grãos de amido e de cristais de sílica ou cálcio, formados dentro das células vegetais. Esses resíduos são liberados na boca durante a mastigação e ficam presos nos dentes quando não escovados. Para recuperá-los, os cálculos são dissolvidos quimicamente e analisados ao microscópio. Muitas evidências, do uso de plantas, inclusive mandioca e milho, têm sido encontradas em dentes achados em sambaquis, deixando claro que os primeiros habitantes do litoral consumiam esses recursos.
É possível ainda fazer a análise de coprólitos (literalmente, “fezes petrificadas“), prova irrefutável de que determinado alimento passou pelo trato digestivo do indivíduo. No Brasil, os coprólitos são mais frequentes no Nordeste - em função do clima local - sendo, em geral, encontrados em cavernas e áreas abertas de regiões áridas, ou no intestino de múmias naturais. A coleta desse material é feita com cuidado para evitar contaminação com DNA moderno e com métodos padronizados, registrando a associação com culturas e períodos específicos. No laboratório, os coprólitos são reidratados e os macrofósseis (sementes, fragmentos de frutas, ossículos, escamas de peixes e outros materiais não totalmente digeridos) e microfósseis (grãos de pólen, pelos, alguns tecidos vegetais e ovos e larvas de parasitas) neles encontrados são separados. Além de investigar visualmente esses materiais, testes químicos são feitos pra identificar DNA antigo e proteínas de parasitas e animais.
O que comemos é um aspecto tão importante de nossas vidas que talvez esteja na raiz do que nos fez adotar, há milhões de anos, uma postura bípede e um conjunto de comportamentos culturais tão diversos daqueles observados nos outros primatas. Sabe-se, hoje, através da comparação dos dois dados obtidos utilizando diferentes métodos, que no passado distante os seres humanos tinham uma dieta diversificada, resultado de seu contínuo processo de adaptação aos mais variados tipos de ecossistemas, lembrando-nos que somos, de fato, o que comemos.
Fonte - JORNAL DO BRASIL - Ciência hoje ( A REVISTA INTELIGENTE DO BRASIL )
Domingo , 18 de fevereiro de 2007 A 28 Hilton P. Silva ( Museu Nacional , UFRJ ) e Karl Reinhard (Universidade de Nebraska - Estados Unidos)
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