terça-feira, 19 de setembro de 2017

Dia da Pátria




Cidadania 
O amor à Pátria é um elemento da dignidade humana.  Como parte integrante do caráter bem formado, ele incorpora o indivíduo à coletividade que as colheu ao nascer e, de certa forma, ao solo, a um determinado espaço geográfico. Caracteriza uma população, fundamenta todo um modo de ser e repercute, profundamente nas mais diversas atividades. Acompanha a pessoa desde que toma consciência de si mesma até ao final de seus dias na terra. É tão forte – quando autêntico - que supera o instintivo medo da morte. Os maiores sacrifícios são suportados. Com ele,  a comunidade se fortalece e, caso contrário, lhe advém a desagregação.
Verdadeiramente, a fé fornece argumentos para nossa dedicação à grandeza do Brasil, ajudando-nos a cultivar esses nobres sentimentos. O último Concílio diz que Jesus “submete-se livremente às leis do seu país" (Gaudium et Spes, n° 32). Uma legislação constitui a estrutura óssea que possibilita a vida harmônica e frutuosa de um Estado. Em Ad Gentes (n° 14), o Concílio Vaticano II explicita os deveres do cidadão que professa a crença em Cristo: “Os católicos sintam-se obrigados a promover o bem comum, na dedicação à pátria e no fiel cumprimento dos deveres civis, e façam valer o peso da sua opinião, de modo a que o Poder se exerça com justiça e as leis correspondam aos preceitos morais e ao bem comum". Numa palavra, o amor à pátria é uma das consequências do 4º mandamento: honrar pai e mãe.
Deus nos fez irmãos, enquanto filhos do mesmo Pai. Essa solidariedade atinge o plano natural. Assim, a família cria estreitos laços que unem e formam a célula base de qualquer nação. Embora menos rígido, esse elo existe também na cidade onde nascemos ou habitamos. E, de maneira  especial, em relação ao nosso país.
Nesses casos, se estabelece um vínculo, que redunda em certa comunhão de bens ou valores, que incluem um “dar e receber. Ele transcende os limites territoriais.  Pela pátria nós nos incorporamos à humanidade. Um povo próspero é fator de progresso para o conjunto universal, se o egoísmo não desfigura o conceito cristão do uso dos benefícios concedidos pelo Senhor. Os exemplos da importância desse inter-relacionamento são inúmeros. Possibilitam, em um mundo dividido, uma visão global do gênero humano.
No Dia da Pátria , ao recordar nossos compromissos inelutáveis com o Brasil, importa lembrar as distorções, para evitar cair em erros funestos, que em muitas nações, têm acarretado lágrimas e sofrimentos sem conta.
O episódio de Pentecostes (cf At 2) nos mostra grupos étnicos, os mais diversificados, reunidos por um acontecimento religioso. Respeitadas as suas peculiaridades culturais, sentem-se irmanados na mesma doutrina, ouvem-na como se fosse no próprio idioma. A grande lição de uma fraternidade que supera divisões.
O nacionalismo exacerbado é o oposto do verdadeiro patriotismo. A falsidade se manifesta pelo rompimento da unidade. Se esta ocorre em plano internacional - salvo casos específicos e justos – provoca o enfraquecimento interior que debilita a comunhão e esteriliza os frutos que da mesma advêm, no ambiente interno. Por isso, o Concílio Vaticano II adverte, em Ad Gentes ( n° 15 ): “Os cristãos  (...) cultivem verdadeira e eficazmente, como bons cidadãos, o amor da pátria, mas evitem absolutamente o desprezo pelas outras raças, o nacionalismo exagerado e promovam o amor universal dos homens". Em outro documento, insiste no mesmo tema: “Os cidadãos cultivem, com magnanimidade e lealdade, o amor da pátria, mas sem estreiteza de espírito, de maneira que, ao mesmo tempo, tenham sempre presente o bem de toda a família humana, que resulta das várias ligações entre as raças , povos e nações“ ( Gaudium et Spes , n° 75 ). Por motivo do sete de Setembro, reacendemos nosso fervor patriótico. Alimentemos esse nobre sentimento, com nossa fé, os ensinamentos de Cristo. Sabemos criticar os erros que os outros cometem. Ao menos, com o mesmo afã, tomemos consciência de um dever: fortificar, no povo de Deus, o amor ao Brasil. Essa atitude deve preceder e dominar nossos ressentimentos. Assim, é mais fácil corrigir deficiências.
Esta data, nos oferece também a oportunidade para recordar o papel da Igreja na formação da nacionalidade. Ela é proclamada por Capistrano de Abreu, em sua conhecida afirmação: “Sem Igreja, é impossível escrever a História Pátria". Desde a descoberta do Brasil, até aos tempos atuais, essa presença tem sido constante. Qualquer tentativa para minimizá-la ou esquecê-la, é esforço inútil. Ela permeia em todas as páginas de nossa vida cívica. Aí estão os monumentos artísticos, e tradições orais, os acontecimentos sociais. A própria índole de nossa gente, o sentimento nacional, falam dessa ininterrupta atuação.
A Epístola a Diogneto, escrita nos primeiros séculos, lembra que  o cristão não permanece encerrado nos limites do seu torrão natal, de sua cultura originária. Ele descobre, em toda parte, valores genuínos, através dos quais serve ao Senhor. Nesse documento está expressa a certeza de que o fiel, ao construir sua pátria terrena , caminha também para a Pátria celeste e definitiva. Sufocá-la seria destruir a autêntica dimensão do ser humano, criado para o Infinito. Sem desdenhar as coisas materiais, ele busca a plena realização na Eternidade.
No Dia da Independência, em nome de Deus e da pátria, movido por um sadio patriotismo, tomemos maior consciência do dever de trabalhar pelo progresso espiritual e temporal de nosso Brasil.

Fonte       -       Jornal   do  Brasil    OPINIÃO     pág A  9
Sábado  , 06/07/2017   - Dom  Eugênio  Sales
Arcebispo  Emérito  do  Rio 

Um comentário:

  1. Parabéns pela reflexão que o texto infere.
    Gostaria de poder compartilhar parte nas redes sociais....
    Grato.

    ResponderExcluir

Deixe seu comentário sobre a postagem.