Cidadania
O amor à Pátria é um elemento da dignidade humana.
Como parte integrante do caráter bem formado, ele incorpora o indivíduo à coletividade
que as colheu ao nascer e, de certa
forma, ao solo, a um determinado espaço geográfico. Caracteriza uma população, fundamenta todo um modo de ser e
repercute, profundamente nas mais
diversas atividades. Acompanha a pessoa
desde que toma consciência de si mesma até ao final de seus dias na terra. É tão forte – quando autêntico - que supera o instintivo medo da morte. Os maiores sacrifícios são suportados. Com ele,
a comunidade se fortalece e,
caso contrário, lhe advém a
desagregação.
Verdadeiramente, a
fé fornece argumentos para nossa dedicação à grandeza do Brasil, ajudando-nos a cultivar esses nobres
sentimentos. O último Concílio diz que
Jesus “submete-se livremente às leis do seu país" (Gaudium et Spes, n° 32). Uma legislação constitui a estrutura
óssea que possibilita a vida harmônica e frutuosa de um Estado. Em Ad Gentes (n° 14), o Concílio Vaticano II explicita os deveres do cidadão que professa a crença em Cristo: “Os católicos sintam-se obrigados a
promover o bem comum, na dedicação à
pátria e no fiel cumprimento dos deveres civis, e façam valer o peso da sua opinião, de modo a que o Poder se exerça com justiça e as leis correspondam aos
preceitos morais e ao bem comum". Numa palavra, o amor à pátria é uma das consequências do 4º mandamento: honrar pai e mãe.
Deus nos fez irmãos, enquanto filhos do mesmo Pai.
Essa solidariedade atinge o plano natural. Assim, a família cria
estreitos laços que unem e formam a célula base de qualquer nação. Embora menos rígido, esse elo existe também na cidade onde
nascemos ou habitamos. E, de maneira especial, em relação ao nosso país.
Nesses casos, se
estabelece um vínculo, que redunda em
certa comunhão de bens ou valores, que
incluem um “dar e receber“. Ele
transcende os limites territoriais. Pela pátria nós nos
incorporamos à humanidade. Um povo
próspero é fator de progresso para o conjunto universal, se o egoísmo não desfigura o conceito
cristão do uso dos benefícios concedidos pelo Senhor. Os exemplos da importância desse
inter-relacionamento são inúmeros.
Possibilitam, em um mundo dividido, uma visão global do gênero humano.
No Dia da Pátria , ao recordar nossos compromissos
inelutáveis com o Brasil, importa
lembrar as distorções, para evitar cair
em erros funestos, que em muitas
nações, têm acarretado lágrimas e
sofrimentos sem conta.
O episódio de Pentecostes (cf At 2) nos mostra grupos
étnicos, os mais diversificados, reunidos por um acontecimento religioso.
Respeitadas as suas peculiaridades culturais, sentem-se irmanados na mesma doutrina, ouvem-na como se fosse no próprio idioma. A grande lição de uma fraternidade que
supera divisões.
O nacionalismo exacerbado é o oposto do verdadeiro
patriotismo. A falsidade se manifesta pelo rompimento da
unidade. Se esta ocorre em plano internacional - salvo casos específicos e justos – provoca o enfraquecimento interior
que debilita a comunhão e esteriliza os frutos que da mesma advêm, no ambiente interno. Por isso, o Concílio Vaticano II adverte, em Ad Gentes ( n° 15 ): “Os cristãos
(...) cultivem verdadeira e eficazmente, como bons cidadãos, o amor da pátria, mas evitem absolutamente o desprezo pelas
outras raças, o nacionalismo exagerado
e promovam o amor universal dos homens". Em outro documento, insiste no
mesmo tema: “Os cidadãos cultivem, com magnanimidade e lealdade, o amor da pátria, mas sem estreiteza de espírito, de maneira que, ao mesmo tempo, tenham sempre presente o bem de toda a
família humana, que resulta das várias
ligações entre as raças , povos e nações“ ( Gaudium et Spes , n° 75 ).
Por motivo do sete de Setembro,
reacendemos nosso fervor patriótico.
Alimentemos esse nobre sentimento, com
nossa fé, os ensinamentos de
Cristo. Sabemos criticar os erros que
os outros cometem. Ao menos, com o mesmo afã, tomemos consciência de um dever:
fortificar, no povo de Deus, o amor ao Brasil. Essa atitude deve preceder e dominar nossos
ressentimentos. Assim, é mais fácil corrigir deficiências.
Esta data, nos
oferece também a oportunidade para recordar o papel da Igreja na formação da
nacionalidade. Ela é proclamada por
Capistrano de Abreu, em sua conhecida
afirmação: “Sem Igreja, é impossível escrever a História Pátria".
Desde a descoberta do Brasil, até aos
tempos atuais, essa presença tem sido
constante. Qualquer tentativa para
minimizá-la ou esquecê-la, é esforço
inútil. Ela permeia em todas as páginas
de nossa vida cívica. Aí estão os
monumentos artísticos, e tradições
orais, os acontecimentos sociais. A própria índole de nossa gente, o sentimento nacional, falam dessa ininterrupta atuação.
A Epístola a Diogneto, escrita nos primeiros séculos, lembra que
o cristão não permanece encerrado nos limites do seu torrão natal, de sua cultura originária. Ele descobre, em toda parte, valores genuínos, através dos quais serve ao Senhor. Nesse documento está expressa a certeza de
que o fiel, ao construir sua pátria
terrena , caminha também para a Pátria celeste e definitiva. Sufocá-la seria destruir a autêntica
dimensão do ser humano, criado para o
Infinito. Sem desdenhar as coisas
materiais, ele busca a plena realização
na Eternidade.
No Dia da Independência, em nome de Deus e da pátria,
movido por um sadio patriotismo,
tomemos maior consciência do dever de trabalhar pelo progresso espiritual e
temporal de nosso Brasil.
Fonte - Jornal
do Brasil OPINIÃO
pág A 9
Sábado ,
06/07/2017 - Dom Eugênio
Sales
Arcebispo
Emérito do Rio
Parabéns pela reflexão que o texto infere.
ResponderExcluirGostaria de poder compartilhar parte nas redes sociais....
Grato.