terça-feira, 27 de setembro de 2022

A cidade de Deus pelo olhar do seu criador e Nilópolis



O  começo  de  tudo

Quando  criança , o arquiteto Giuseppe Badolato viveu a experiência de habitar uma moradia pequena e improvisada . O pai, um mecânico italiano , veio para o  Brasil na década de 1940 , em busca de uma  vida melhor, e, sem dinheiro , alugou a garagem de uma  casa no  Grajaú . Numa  área de aproximadamente  18 metros  quadrados  , instalou a  residência onde a  família morou por uma década . A ideia que é  possível viver com dignidade num espaço pequeno acabou servindo de inspiração para futuros projetos de Giuseppe . O conceito foi usado nas  casas que ele e  sua equipe  desenharam quando foram convidados para planejar um  novo bairro no Rio a  Cidade de Deus .  

- Era a ideia da  casa evolutiva , chamada de embrião . Nada mais é do que você dar uma cédula mínima ,que,de acordo com as condições da família,tivesse condições de crescer com facilidade . Todos os  terrenos tinham o mesmo tamanho , 120 metros quadrados , para a construção de casas de 18 a 40 metros quadrados . Os imóveis eram agrupados em unidades quadra ,que tinham no meio duas quadras e ruas de pedestres , que as famílias tivessem acesso a  saneamento básico, vias pavimentadas e luz . O tamanho da cada um , eles poderiam ir aumentando aos poucos – conta Giuseppe.

A  Cidade de Deus era para ele e sua equipe a primeira grande oportunidade de fazer nascer de suas pranchetas um  bairro popular de qualidade . A descrição do  projeto caberia  perfeitamente num  empreendimento mobiliário de  classe média dos  dias de hoje  :  eram unidades de um ,dois a três quar tos , instaladas em quadras com  área de lazer , praças arborizadas , escolas , posto médico , farto comércio e um cinema . Nas esquinas ,casas de dois andares permitam instalação de pequenos bares e mercados no primeiro pavimento . Até hoje , Giuseppe fica  ressentido quando chamam o  lugar  de favela.

- A Cidade de Deus nasceu com a  filosofia de um bairro completo , o escoamento de água era  su-perficial , não alagava , todas as ruas eram pavimentadas . Em um projeto inovador , que deveria ser modelo , para um  grande programa habitacional .E não era só  urbanismo e arquitetura .Previa a  criação de  comunidades de autogestão e de um progressivo  crescimento social . A ideia era encami- nhar as pessoas que iam morar ali para  cursos profissionalizantes , preparar para o trabalho – diz que ele , que conta ter recebido a  missão de criar o  bairro de  Sandra Cavalcanti , secretária de Serviços Sociais da  Guanabara no Governo Carlos Lacerda .

COMUNIDADE  SUFOCADA 

Criado sobre um  terreno de aproximadamente 70 mil metros quadrados ,onde havia uma antiga fazenda , o desenho original previa a  construção de 3.053 habitações , além de equipamentos urbanos,divididos inicialmente,duas  “glebas “ . A primeira , delimitada pela Rua Edgard Werneck e pelo Rio Grande com 2.492 unidades ,e, a segunda ,na outra margem do mesmo Rio , com 561
casas . Construída pela  Companhia de  Habitação  Popular do  Estado da  Guanabara e  finan -
ciada pelo Banco Nacional de Habitação ,a Cidade de Deus terminou de ser implantada após o governo Negrão de Lima . Todo o projeto totalizava  990 mil metros quadrados com 5451 moradias , beneficiando cerca de 30 mil pessoas . 

- A terceira e quarta glebas surgiram depois.Na terceira, já na fase do Negrão de Lima, o conceito tinha mudado e queriam construir mais unidades em menos tempo. A solução foi fazer apartamentos.No quarto terreno,eu já não participei tanto.Ao longo dos anos foram ocupando as áreas em volta ,e, o que não ocuparam , foram deixando favelizar . A Cidade de Deus , que era um  bairro , foi sufocada , com uma porção de favelinhas em volta .Virou o que todos nós sabemos - lamenta o arquiteto,que antes esteve à  frente da construção dos  núcleos de  Vila Aliança , em Bangu ;  Vila Kennedy , em 

Senador Camará e Vila Esperança , em Vigário Geral. 

As obras da  Cidade de  Deus foram iniciadas em 1965 , com a construção de 1.500 casas no primeiro terreno , que deveriam ser concluídas no segundo semestre de 1966. Os moradores que receberiam as chaves , removidos de  favelas da Zona Sul pelo governo Carlos Lacerda , conta  Giuseppe , já haviam sido  entrevistados e  cadastrados por assistentes sociais. 

- Mas , em janeiro de 1966 , uma grande enchente mudou tudo . Milhares de desabrigados foram alojados em escolas , no estádio do  Maracanã e na Vila kennedy  -  recorda .

Nesta ocasião , 1.200 das 1.500 casas da primeira fase da  Cidade de Deus estavam em pé , mas ainda falatavam as obras de infraestrutura . Alguém deu a ideia de colocar os  desabrigados provisoriamente lá .

- E assim foi deito .O que era para ser provisório dura até hoje .A segunda gleba ainda nem tinha começado a ser feita , porque na época ainda estávamos vendo a construção de uma ponte que daria acesso ao local - critica o arquiteto.

Começava naquele momento dar  abrigo a todos , conta  Giuseppe , foram construídos banheiros coletivos e vagas de ocupação transitória,chamadas de unidades de triagem, que , em março de 1966 , permitiam a transferência das  famílias em condições muito precárias . As ligações de  água e esgoto e todas as obras de infraestrutura da primeirafase foram feitas com moradores já nas casas .

MAPAS  PRESERVADOS 

Aos 82 anos, Giuseppe olha os  mapas e plantas do passado e  tenta identificar o que foi invadido . Pelas suas contas , pelo menos  dez praças  foram tomadas por  barracos sem contar os  puxadinhos nos  prédios e as mais  muitas construções irrregulares que hoje mapeiam o rio e fizeram a  comunidade ultrapassa sua  área oriuginal .  Hoje , ao ver mais uma vez o  lugar no  noticiário policial , ele se recorda do  conceito do  programa . E não consegue conter a emoção.

Comecei a querer dar uma solução dar um alerta , quando vi o  filme Cidade de Deus . Eu chorei no cinema porque  o sonho era propor  às comunidades um grandioso plano para acabar com a questão do favelado e da  ocupação irregular . Dar  bairros dignos ,onde as pessoas pudessem  viver como em condomínios. Muito triste o que houve, por causa do abandono . Durante muitos , estado e prefeitura não assumiram a  Cidade de Deus de vez em quando .

Apesar da  desfiguração de seu projeto original ,Giuseppe ainda acredita na  recuperação ou urbanística do local.

- É preciso fazer uma avaliação arquitetônica, urbanística e social , para que seja possível , mesmo depois de 50 anos , reintegrar o lugar à cidade , restituindo as características originais de bairro -  idealiza ele , que guarda fotos e muitas  boas histórias do lugar .*

Fonte  - Jornal  O GLOBO  -  pág 31  - Design Rio

Domingo , 4.12.2006   - Simone Candida , Ludmila de Lima e Natália  Boere




Histórias  que  devem  ser  contadas 

DOCUMENTÁRIO

' Judeus  em  Nilópolis '  descortina  o  processo  de  colonização  polonesa  na  cidade  da  Baixada , após 1920

Autora  do livro Vivência judaica em  Nilópolis ( Imago ) , a polonesa Esther London, morta em 2007 aos  92 anos , é um dos  fios condutores do documentário  Judeus  em  Nilópolis ,do jornalista  tadamés Vieira , ainda sem data de lançamento . O vídeo conta a  história de 300  famílias  judias que se  estabeleceram no  município da  Baixada Fluminense a partir de  1920  . As famílias , incluindo  Esther  ( que foi  para lá  assim que se casou , com um polonês , no Brasil ) , mesmo passando por  sérias dificuldades financeiras , praticamente des bravaram o município , montando uma numerosa comunidade e até construindo uma  sinagoga , a Tiferet Israel , fechada desde 1970 . 

Um dos objetivos do documentário é chamar a atenção do poder público para a  necessidade da  preservação dessa  sinagoga . É um  prédio  histórico , completamente abandonado -  diz Vieira , orgulohoso de ter conseguido Esther a tempo .  -  Ela me  inspirou muito , tinha uma  memória fantástico . Falou a respeito da  chegada dos  judeus ao Brasil , das coisas que não existiam na  Polônia . E eles foram  responsáveis pelo  começo da urbanização do município .Filho de Esther , o engenheiro  Pedro London lembra , saudoso , da comunidade. 

- Lá se falavam  quatro  línguas : português ,  polonês , hebraico e iídiche . E havia detalhes singulares - recorda . - Hoje não há  judeus sapateiros ou mecânicos . Havia vários , até porque a  profissão de  sapateiro era  valorizada na  Polônia . E havia convivência entre  imigrantes judeus e árabes , que também viviam na região .

A  colonização em  Nilópolis ocorreu quando já havia vários judeus em locias centrais do  Rio a  Praça !  Também havia  judeus em bairros como  Madureira e Méier . Mas o município da  Baixada Fluminense tornou-se o epicentro dos  imigrantes . Boa parte deles vinha da  Polônia ,numa época em que a  Rússia czarista  perseguia a  população judaica . Eles se estabeleceram nos  arredores da  Avenida General Mena Barreto , no centro de  Nilópolis . 

- A Praça 11 já estava super lotada . E os  terrenos em Nilópolis eram baratos .Além disso ,pela linha férrea ,era o primeiro município - diz o diretor,que promoveu um encontro de ex- moradores  judeus da cidade ( alguns já morando em  Israel há de  décadas ) que começava com uma  viagem de trem . - Também lançamos em  português o livro  Novos Lares ,editado em  iídiche em 1932 por  Adolfo Kischinevisky,que mo-rava em  Nilópolis .O livro foi traduzido pela  Sara Morelenbaum ,mãe do (violoncelista ) Jaques Vieira, que não é  judeu , mas morava em  Nilópolis na época em que  a  cidade era  habitada  por muitos  judeus ,pôs-se a correr atrás de personagens .Entre telefonemas e  viagens  internacionais , reencontrou  amigos de infância , como  Chaim  Litewski , hoje jornalista em  Nova York , e descobriu que  pessoas conhecidas , como a  atriz Teresa Rachel e o secretário municipal de Saúde ; Jacob Kligernnan , são  judeus de Nilópolis .

- Com exceção de poucos  os judeus não têm relação com a cidade desde os anos 70      -  lembra Vieira .  -  Hoje ficaram só  a sinagoga e o cemitério comunal  Israelita  de  Nilópolis , construído em  1935 . Vieira , que teve apoio financeiro do Centro da  Cultura Judaica ( da Casa da Cultura de Israel ) , aguarda a  finalização do  documentário . Já foram gastos  R$ 100 mil na realização e falta R$ 50 mil terminá-lo . Ele crê que o filme pode servir para dirimir  lugares-comuns .

- Os judeus progrdiram , sim . Mas , no Brasil , tiveram toda uma  história de luta , que as pessoas não conhecem - conta. 

Fonte  -  Jornal  do  Brasil -  pág  B7  - Caderno  B 

Domingo , 7 de  setembro de 2008   - Ricardo Schott






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