sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

 




Turbilhão

Fico escutando as quantias ( dois milhões , quatro , nove ) , e a  cifra vai  aumentando até que de milhões a  bilhões muda apenas a consoante no início da  palavra,pois pa -rece que já não se trata de  dinheiro – entramos num  território mais subjetivo e ina -gível. 

Que  grana toda é essa que saía de uma  conta- corrente para entrar em outra , numa transferência que parecia uma simples  jogada do  banco Imobiliário ?  O  brinquedo da  Estrela existe até hoje e é assim descrito nos sites de venda: “ Você agora poderá ser um  próspero proprietário de  imóveis. Ter crédito em banco , títulos e hotéis nos melhores pontos da cidade . Onde o céu é o  limite ...Cabe a você  investir tudo que possui para tornar-se um  milionário e monopolizar o  mercado. Para isso , você terá que provar que tem faro para os negócios.

Dinheiro de  papel . A gente se divertia com isso. Era fácil se sentir rico. Ter o  céu como limite . Em que momento a  pessoa se apega a uma  fantasia  infantil que não consegue mais crescer ?  Troca  dinheiro de papel por  dinheiro de verdade sem perceber que está negociando outros valores. 

Ouço , leio : sete  milhões , vinte e cinco  milhões , trezentos  milhões . E apenas uma palavra me vem à cabeça : pobreza .Que vida  miserável.Não bastasse a total ausência de escrúpulos , a pessoa não consegue se contentar com o suficiente , nunca atinge um montante que sirva para apaziguar sua  insignificância.A ganância é um sorvedouro, o muito é pouco , é nada para quemcarrega dentro de si um  buraco  profundo no lugar onde deveria haver  retidão.

Dizem que todo  mundo tem um  preço.Qual o  meu , qual o  seu ? Que  saldo deveria aparecer em nosso  extrato para nos sentirmos  seguros , satisfeitos e dizer : o.k.,  já tenho o que  preciso,me  basta.

Não é aos trinta nem aos quarenta anos  de idade que a  gente começa acumular  bens.Nosso  patrimônio é constituído bem mais cedo , antes até de aprendermos a  brincar com o Banco  Imobilário . O que investiram em nós, na  infância ,que vai deteminar para que servirá, de verdade ,   o nosso  faro, se para correr atrás de uma  vida digna ou para enfiar  nariz numa  lixeira.

Se fizerem  investimentos no nosso caráter  na nossa  inteligência , na nossa segurança  emocional , seremos tão  ricos , que não nos importaremos de parecer uma  pessoa barata aos não  gigante ,como um  carro legal e não um  tanque de guerra, e nos ves-tiremos com  despojamento em vez de desfilar por aí feito uma  árvore de  Natal . Alguém tem  medo de parecer barato aos  olhos dos outros ?

Infelizmente , a lista é longa . Bem  mais  longa ...

Fonte  - Revista  O  CLOBO  -   pág  8 

Vinte e três de abril, de dois mil e dezessete -  Martha  Medeiros

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