No romance de Vintila Horia “ Deus nasceu no exílio “ , que é o diário do poeta latino , Oví-dio , exilado em Tomes , podemos colher na evolução interior de um dos poetas mais fúteis de todo o paganismo romano , o que terá sido na alma dos melhores pagãos a expectativa de uma verdade melhor do que a de seus deuses falsos e corruptos . Ovídio , quando pressente a che-gada desse Outro que está para vir , que já veio no ano de sua morte , ( 17 d .c. ) mas ainda não manifestou aos gentios senão no presépio escreve : “ Esse tempo de loucura e de esperança tal como é o nosso, é o tempo da expectativa de Deus “ .
As divindades romanas , depois de contaminadas pela influência grega , se revelam à consciência humana , cada vez mais indignas de amor e devoção . O fim do culto , para aqueles e conjurar seus maléficos efeitos . Daí o caráter utilitário da religião romana e seu cunho antes jurídico que moral ou místico : “ dou - vos isto , ó deuses , para que vós deis algo em troca “ .A multiplicação dos deuses repugna aos melhores espíritos , mas poucos sofrem o suficiente para inclinar-se sobre o vazio da própria alguma . Os romanos são guerreiros e juristas .Quando são poetas , como Ovídio , são gozadores da vida e a verdade raramente se entrega a tal categoria dos homens . Foi só nos sofrimentos do exílio , que Horia pode atribuir a Ovídio essas profundas reflexões ; “ Sofro neste desterro e luto em minhas cartas para obter o perdão e voltar um dia para a minha terra ,ou , ao menos , ser exilado para outra parte ,onde haja um clima mais suportável e homens mais civi-lizados ,mas nunca lamentarei o instante em que pude inclinar-me livremente sobre a minha alma ,sem degosto, sem medo e sem humilhação .Foi nas praias do Ponto - Euxino ,cujas águas parecem por vezes tão negras que dir – se – ia a morada das trevas , que comecei a ser um homem “ .
O ceticismo , que é uma etapa da decadência da religião romana ,marca também o fim de uma ilusão ,sobre a qual se erguera o Império de Augusto e de todos os Césares .O ceticismo de Marco Aurélio , o espiritualismo erudito de Cícero , o pessimismo desesperado de Lucrécio são afirma ções de que a chaga da alma pagã é in-curável , porque rejeitando os de deuses maus do paganismo , nada acharam para encher o imenso vazio .Na poesia de Virgílio perpassa porém , um sopro de esperança .
Há portanto , uma ferida na alma pagã , que é a morte . Nenhum homem contenta com o que é puramente humano .Todo homem é , como foi Léon Bloy , um peregrino do Absoluto . A nostalgia da imortalidade e da posse da vida eterna deixou sulcos profundos na alma de todos os ho-mens . Não há glória mais triste ,do que aquela que se confina no tempo .E assim é toda glória humana no dizer da escritura : como a palha que o vento leva para fora da eira no tempo do estio . A carne é uma muralha que separa em vez de unir e a matéria é um obstáculo , enquanto não é perpassada pelo sopro do espírito .Os pagãos sentiram essa verdade , viveram-se mesmo nos seus pecados e nas suas misérias e foi por isso que Roma ,a mais corrupta cidade do mundo an-tigo , acolheu a Chegada de Deus .
Fonte - Revista Primavera – 1962
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