Para desmitificar o espaço ,cumpre levar em conta dois lados essenciais de um lado a paisagem , funcionalização da estrutura técnico - produtiva e lugar da fetichizações de outro , a sociedade total , a formação social que anima o espaço .Por conseguinte , cabe-nos também desmitificar o homem .
Vemo-nos ao mesmo tempo diante de um problema de conhecimento e diante de um problema moral .
Desfetichizar o homem e o espaço é arrancar a Natureza os símbolos que ocultam a sua verdade , vale dizer : " tornar significante a Natureza e tornar naturais os signos " ( Gillo Dorfles , 1972 ) é revalorizar o trabalho e revalorizar o próprio homem ,para que ele não seja mais tratado como valor de troca .
Poucos geógrafos e cientistas sociais suspeitaram que toda discussão filosófica em torno da perce- pção e da objetividade os interessava , da mesma forma que a metamorfose do universal em parti-cular ,de essência na existência , que constituem a base mesma de uma fenomenologia da Natureza . A discussão teórica limitou -se , a princípio , ao diálogo homem - natureza , mas essa discussão apre-sentava-se sob uma forma dualista .
Permaneceu -se na ideia de que a percepção não se referia ao sujeito nem tampouco ao objeto , de que o comportamento era estranho às determinações sociais , como se a práxis individual de cada uma reunida às práxis individuais dos demais desse como resultado a práxis social em sua totali-dade quanto ao espaço fetichizado e a Geografia tornou-se ideológica , hostil ao real .
Enquanto neste mundo é regido pela lei do movimento , as ciências do homem deter o pensamento e dissociar -se da dinâmica social isto é , da realidade . Quando o método está aquém da descoberta , as ciências humanas ficam atrasadas em relação ao futuro e mesmo em relação ao presente , por trabalharem unicamente com o já feito .
Deveríamos fazer da autocrítica um ato de consciência assim como Saul Bellow o fez em relação aos escritores quando recebeu o Prêmio Nobel de Literatura de 1976 , ao dizer : " Nós não repre-sentamos a humanidade de maneira adequada " .
Certo ,nós não mudaremos o mundo , mas podemos mudar o modo de vê-lo . Isso é importante porque só assim poderemos escapar ao dogmatismo epistemológico e marcar um encontro com o futuro . Precisamos , ainda uma vez , recorrer a Sartre (1963 , p. 96 ) "homem como perspectiva do futuro , e que esse futuro penetra até o coração de cada um como uma motivação real ao seu com-portamento " .
Haveremos então de construir uma outra moral , aquela reclamada por Eric Fromm ( 1976 ) para a humanidade rejuvenescida , moral em que o ser ultrapassa o ter , em que a generosidade ultra-passa o egoísmo . Mas uma moral é também um programa político , caso não queira esgotar -se na retórica . Se , como afirma V. Ferkiss ( 1969 , p. 101 ) , essa filosofia " é essencial se quisermos sobreviver como seres humanos numa sociedade humana " , devemos então bater -nos para que ele triunfe , fabricando os instrumentos teóricos e práticos da reconstrução .
Devemos nos preparar para estabelecer os alicerces de um espaço verdadeiramente humano , de um espaço que possa unir os homens para e por seu trabalho ,mas não para em seguida dividi -los em classes , em exploradores e explorados ; um espaço matéria - inerte que seja trabalhada pelo homem mas não se volte contra ele ; um espaço Natureza social aberta à contemplação direta dos seres humanos , e não um fetiche ; um espaço instrumento de reprodução da vida , e não uma mercadoria trabalhada por outra mercadoria , o homem fetichizado .
Fonte - Pensando o Espaço do Homem - págs 39 a 41 Editora da Universidade de São Paulo - 5a Edição ( 2021 ) MILTON SANTOS
" Quando a divisão do trabalho e a cooperação perversa por ela ocasionada se estendem à escala do planeta, o mundo como espaço se torna espaço global do capital " .
Milton Santos está a nos dizer que o mundo da mercadoria se tornou o mundo ; que a universa-lidade abstrata do dinheiro ( capital por excelência) atinge o mais recôndito dos lugares e as mais finas , as mais tênues relações ; que ao indivíduo , sujeito histórico gestado no longo processo de mundialização do capital, vai sendo negada a individualidade , restando -lhe a competição genera-lizada ; nestes termos , a vida se estabelece no irrisório , dominada pela pobreza com os seus múl-tiplos sentidos .
Mas como Milton Santos desconfiava que isso não poderia encerrar a História inteira , deixou a mensagem de que " é inútil imaginar que a pobreza poderá ser eliminada sem a eliminação da atua estrutura de produção os investimentos do consumo " . " A produção viabilizada pelas reais necessidades da maioria da população deve ser solidária com essa . Não mais se tratará de uma produção autônoma como até agora , mas estritamente ligada ao consumo da sociedade como um todo " .
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