terça-feira, 25 de setembro de 2018

Uma nação a ser descoberta



Como  era  o  Brasil  antes  de  Cabral  aportar  aqui?  Os   registros  não  são escritos, mas  vestígios  arqueológicos  mostram  quem  foram  os  primeiros  habitantes  das  terras  brasileiras. 

O Brasil tem muito mais do que 500 e  poucos anos  . Bem antes da chegada de Pedro Álvares Cabral que em 1500, o que viria a ser nosso país era já ocupado. Quando os portugueses aqui aportaram, encontraram uma terra habitada por dezenas de grupos étnicos. Pesquisas genéticas comprovam que uma alta porcentagem de brasileiros possui antepassados indígenas, talvez até mesmo metade da população total. Além disso, nossos costumes mantêm tradições indígenas, como a assiduidade nos banhos, o uso de redes para dormir, as comidas feitas de mandioca e milho , além de uma infinidade de termos de uso corriqueiro , como pipoca , caipira ou capoeira . Nem sempre notamos , mas somos mesmo a nação tupiniquim .

Como tudo isso começou ?  Quando chegaram os primeiros seres  humanos  ao  continente  americano ? E como podemos saber sobre esse passado, sem os documentos escritos, que foram introduzidos pelos portugueses ? Para estudar a História antes do uso de escrita , recorremos à Arqueologia, que analisa os vestígios humanos : objetos feitos pelos homens, ossos humanos e animais, e tudo o que de material restou dos tempos antigos. Além disso, contamos com outras disciplinas. A Linguística estuda os idiomas indígenas e nos ajuda a entender as relações entre as línguas dos povos de nosso país. A Biologia também é importante, ao estudar os esqueletos humanos e de animais e ao analisar os genes das populações e dos restos humanos antigos. Se usarmos todos esses recursos, podemos chegar mais perto de descobrir quando chegaram os primeiros habitantes. 

ESTUDOS  E  PROPOSTAS 

Os vestígios humanos mais antigos datam de pouco mais de 10 mil anos. São esqueletos raros, encontrados em cavernas, como em Lagoa Santa (MG). O mais famoso e controverso é um crânio, descoberto em 1975, naquela localidade mineira e conservado no Museu Nacional do Rio de Janeiro. O biólogo e estudioso da pré-história Walter Alves Neves , da Universidade de São Paulo, batizou esse crânio com o charmoso nome de Luzia.  

O grande estudioso dos crânios humanos propôs que Luzia fazia parte de uma população muito antiga de africanos ou aborígenes australianos que não deixou descendentes. Neves mediu outros crânios dessa época encontrados no continente americano e chegou à conclusão de que eram todos parte de uma primeira leva de colonizadores. Para que estivessem no Brasil já havia 10 mil anos, teriam de ter chegado muito antes, uma vez que a rota mais provável seria pelo Estreito de Bering, que separa a Ásia da América, entre os atuais Estados Unidos e a Rússia. Neves não sabe como teriam sido extintos, mas supõe que esses antigos colonizadores tenham sido mortos pelos indígenas, de tipo asiático, não africano, que chegaram depois. 

Nem todos aceitam a proposta do biólogo da USP. De todo modo, outros também propuseram que o Brasil tenha sido habitado há muitos milênios. Duas arqueólogas destacam-se nesse sentido. Maria Conceição Beltrão , do Museu Nacional do Rio de Janeiro, interpreta vestígios que seriam associados a seres humanos na Bahia, com datações entre 500 mil e 2 milhões de anos

Neste caso, teriam vivido aqui hominídeos, espécies que nos antecederam, já que nossa espécie, o Homo sapiens, tem apenas pouco mais de 100 mil anos. Niède Guidon encontrou no Piauí vestígios , como pedras e fogueiras , com datações de 50 mil anos. Como teriam chegado esses antepassados ao Brasil ? Segundo Beltrão , diretamente da África , por meio de um aponte de gelo entre o que hoje são a África do Sul e a Argentina

Guidon avança outra hipótese: os homens teriam partido da Ásia há cerca de 70 mil anos , por navegação, de ilha em ilha, no Pacífico, até atingir a América do Sul. Não há comprovações mais firmes para a presença humana antes dos 12 mil anos, mas as pesquisas arqueológicas continuam e podem trazer descobertas a qualquer momento. 

NAÇÃO  TUPINIQUIM 

O certo é que o Brasil foi ocupado há mais de 10 mil anos . Todo o planeta passou por uma mudança climática. A Terra passa , em intervalos de milhares de anos, por períodos de frio ( glaciação ) e aquecimento. A última glaciação do planeta foi há 20.000 anos e o aquecimento seguiu-se, período no qual vivemos. Na era do frio, os polos acumulavam gelo e a área tropical do planeta era bem menor. A umidade, a vegetação, a fauna e flora mudam. No caso do Brasil, a zona temperada ia muito mais ao norte do que hoje, atingindo o estado de Minas Gerais . O aquecimento gradativo trouxe mudanças diversas, dentre as quais uma que afetou os antigos habitantes foi a progressiva extinção de espécies de animais gigantes. Viviam aqui grandes mamíferos como o megatério e o gliptodonte. Esses animais eram caçados pelos humanos, mas sua extinção deveu-se provavelmente às mudanças climáticas.

Isso pode ter contribuído para que a caça, a pesca e a coleta tenham sido complementadas pela agricultura. Na América do Sul , o cultivo das plantas parece ter começado na Amazônia já de clima pós-glacial, há cerca de 6 mil anos . Os linguistas sugerem que nessa mesma época tenha se intensificado a diversificação dos idiomas , concomitante a um grande aumento de populações ameríndias. Os principais grupos linguísticos do Brasil surgiram: jê, tupi, aruaque e caribe.

A agricultura gerou outros desenvolvimentos ligados ao processamento de alimentos, como vasilhas de cerâmica , pilões , prensas de mandioca , raladores, assim como técnicas de cozimento e torrefação. Tudo isso favoreceu a maior divisão social, e também incentivou a competição por recursos. As guerras intensificaram-se, como se pode notar pela difusão de pontas de flecha, embora elas fossem usadas também para a caça.

Na costa surgiram povos que se aproveitavam dos ricos recursos marítimos e formaram imensas colinas artificiais, os concheiros ou sambaquis. Tendo surgido há 8 mil anos, difundiram-se entre 5 mil e 3 mil anos atrás, tendo deixado de existir antes da chegada dos portugueses , quando , antes disso , os tupis e os jês chegaram à costa do Brasil , vindos do interior do continente . No Sul do Brasil, onde persistia o clima mais frio no inverno, difundiram-se abrigos subterrâneos, usados para a proteção contra as baixas temperaturas.  

Na  Amazônia surgiram grandes assentamentos. A arqueóloga norte-americana Anna Roosevelt, grande estudiosa da pré-história amazônica, propõe que ali tinha surgido uma civilização com cidades, população crescente, agricultura intensiva, artesanato especializado e uma estrutura social hierarquizada, de base matrilinear, na qual as mulheres tinham grande destaque social.

A partir do estudo da cerâmica da Ilha de Marajó, Anna considera que as mulheres eram chefes dos clãs e que os atributos femininos, como os seios e o útero, figuravam com destaque nas representações artísticas desse povo. Por esse motivo, quando da chegada dos europeus, eles encontraram as mulheres no comando e lembraram-se do mito grego das guerreiras Ama zonas, o que derivou, portanto, o nome do rio e, depois , de toda a região

Os povos indígenas não foram extintos com a chegada dos portugueses. Embora tenham sofrido como epidemias, escravismo e tenham se refugiado no interior do continente, formaram a base do País. Eram eles que conheciam o terreno e as plantas , foram índias as mulheres dos colonizadores e dos brasileiros , pelos séculos seguintes . A diversidade cultural brasileira tem, portanto, nos indígenas uma de suas grandes riquezas.

Fonte -  PRÉ- HISTÓRIA  NO  BRASIL 
FUNARI , Pedro Paulo , Os Antigos Habitantes do Brasil , Editora Unesp . São Paulo :2000 FUNARI , Pedro \ e Noelli , Francisco Silva . Preé-História do Brasil . Contexto . São Paulo : 2002  GUARINELLO , Norberto Luiz . Os Primeiros Habitantes do Brasil . Atual Editoa , São Paulo , 1994  - Parque Nacional Serra da Capivara , Fundação Muaseu do Homem Americano , Piaui, 1998.

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