terça-feira, 15 de outubro de 2019

Bertold Brecht: comunicação, poesia e revolução



Nos dois últimos números da Comunicação  &  Educação dedicamo-nos a mostrar como se desdobram nos textos poéticos determinados processos de apropriação intertextuais e interdiscursivos . Falamos , então , das recorrências entre Eduardo Alves da Costa Martin Liemöller e Bertold Brecht . Acerca dos dois primeiros, fizemos comentários e arrolamos textos; sobre o último, reservamos esta edição da revista .

Eugen  Bertold  Friederich  Brecht ( Bertold  Brecht ) , nasceu na cidade alemã de Ausgsburg , na Baviera , em 10 de fevereiro de 1898 , e morreu em 14 de agosto de 1956 , em Berlim . Dramaturgo , poeta teórico do teatro , agitador de ideias , Brecht é considerado um dos mais importantes teatrólogos do século XX, com peças que marcaram profundamente a história do teatro , entre elas: Na selva das cidades , A  exceção e a  regra , Mãe  Coragem , O círculo  de  giz caucasianio , Galileu, Galilei .

Por volta de 1924 o jovem Brecht mudou-se para Berlim , onde começaria profícua carreira teatral , inicialmente como assistente de dois dos mais celebrados diretores da época , Max  Reinhardt e Erwin  Piscator . Estando vinculado às ideias de esquerda  , Bretch chocou-se com a trajetória ascendente do nazismo , tendo que se exilar em países como a França , Dinamarca , Finlândia e Estados Unidos - onde permaneceu entre 1941 e 1947 . Acusado de atividades antiamericanas , retornou a Alemanha  , fixando-se, definitivamente em Berlim Oriental , onde fundou o Berliner  Ensemble  ,grupo que promoveria significativas experiências com a linguagem teatral e que levou à cena as últimas peças escritas por Brecht.

Ocupado em dar continuidade à ideia de que só há conteúdo revolucionário se existir forma revolucionária e vice-versa , ele desenvolveu a teoria do teatro épico-dialético , que se opunha de maneira frontal ao teatro dramático , de fundo aristotélico,considerado pelo autor de  Galileu  Galilei como um mecanismo dramaturgo que gerava ilusão da realidade , reduzindo , em consequência , a capacidade crítica do espectador . A teoria brechtiana propunha o chamado de distanciamento , através do qual caberia evidenciar os processos cenográficos , mostrando as estratégias que envolveu os diversos elementos que entram na economia geral da peça ; com isso , o objetivo era de  ao mesmo tempo quebrar a ilusão do real e intensificar a percepção crítica do espectador , colocando-o diante dos desafios ideológicos e políticos propugnados pelo texto teatral. 

A poesia de Brecht não alcançou a dimensão de grandiosidade das peças teatrais , contudo ela também possui importância pelo caráter anti-sentimental ,combativo e mesmo didático . Tanto nos textos que compõem O  livro  da  devoção  caseira 
( Die  Haupostile ) , de 1927 , quanto em Poesias de Svendborg ( Svendborger
Gedilchte) , de 1939 é perceptível a mesma preocupação com o efeito do estranhamento , traduzida em poemas de alto envolvimento político , desdobrado em temas como a resistência à barbárie , a luta pela justiça social , a denúncia da alienação e o engajamento em acontecimentos sociais . Em uma palavra , segundo a compreensão de Brecht , poesia e revolução social devem caminhar do mesmo lado .

POEMAS  DE  BERTOLD  BRECHT  

Os  que  lutam 

Há  aqueles  que  lutam  um  dia ; e  por  isso  são  muito  bons  ;
Há  aqueles  que  lutam  muitos  dias  ; e por  isso  são muito  bons ;
Há  aqueles  que  lutam  anos ;  e  são  melhores  ainda ;
Porém  há  aquele  que  lutam  toda  a  vida  ; esses  são  os  imprescindíveis .

O  analfabeto  político  

O pior analfabeto é o analfabeto político .
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos .
Ele não sabe que o custo de vida , o preço do feijão , do peixe , da farinha , do aluguel , do sapato e do remédio dependem das decisões políticas .
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política .
Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta . o menor abandonado , e o pior de todos os bandidos que é o político  vigarista , pilantra , o corrupto e lacaio dos exploradores do povo.


PRIVATIZADO 

Privatizaram sua vida ,  seu trabalho , sua hora  de  amar
e  seu  direito  de  pensar 
É da  empresa  o  seu  passo  em  frente, 
seu  pão   e  seu  salário .
E  agora  não  contentes  querem , 
privatizar  o  conhecimento  , a  sabedoria  ,
o  pensamento , que  só  à  humanidade  pertence .

Um  homem  pessimista  

Um home pessimista
É  tolerante .
Ele  sabe deixar a  fina  cortesia  desmanchar-se  na  língua 
Quando  um  homem  não  espanca  uma mulher 
E  o  sacrifício  de  uma  mulher  que  prepara  café 
para  seu  amado 
Com  pernas  brancas  sob  a  camisa  
Isto  o  comove  .
Os  remorsos  de  um  homem  que 
Vendeu  o  amigo 
Abalam-no ,  a  ele  que  conhece  a  frieza  do  mundo
E  como  é  sábio 
Falar  alto  e  convencido 
No  meio da  noite .

Como se percebe deste conjunto de poemas , eleva-se a temática social , política , de chamamento à consciência e à participação dos cidadãos . Podemos dizer que se cria um ambiente discursivo preocupado com a comunicação com os leitores e que recolhe e expande diálogos com outros textos de poetas nutridos pelas temáticas evidenciadas por Brecht . É neste quadro de contaminações interdiscursivas que filiamos Eduardo  Alves  da Costa  , Martin  Niemöller  e  Bertold  Bretch .

Fonte  -   Revista  -   COMUNICAÇÃO  &   EDUCAÇÃO   -   págs  109,110 ,111 e 112 
Maio/ Agosto 2007 Ano  XII - N. 2  - Revista  do  Curso  de  Gestão  
Adilson  Citelli , Professor livre-docente no Departamento  de  Comujicações  e  Artes  da  ECA-USP e chefe do Departamento  de  Comuicações  e  Artes 

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