sexta-feira, 5 de setembro de 2025

Colinização trouxe corruptos para o País

 








Em 1665 , o  Padre  Vieira  já denunciava , no “  Sermão  do  Bom Ladrão “ , a corrupção que grassava no  Brasil , praticada  principalmente  por  funcionários portugueses . Com  muitas colônias ,o Império Português não conseguia organizar uma burocracia eficiente, e a confusão favorecia a  proliferação de roubos e negociatas .Governadores , juízes e fiscais da  Coroa se aproveitavam da  falta de controle  e enriqueciam poucos  anos após  a  chegada  ao  Brasil

Em meados do século 17 , o Brasil já se encontrava à beira do abismo . Essa , pelo menos , é a desoladora certeza que deve ter ficado nos fiéis presentes à  Igreja da  Misericórdia de  Lisboa naquele domingo de 1665 em que o Padre  Antônio Vieira pronunciou as célebres frases do seu Sermão do Bom  Ladrão . “ Perde - se o Brasil ( digamo - lo em uma palavra) porque alguns ministros de Sua Majestade não vêm cá buscar nosso bem , vêm cá buscar nossos bens   ( … )  El - Rei  manda -os  tomar  Pernambuco  e eles  contentam - se com o tomar  ( … )  Toma  nossa  terra  o ministro  da  Justiça ?  Sim , toma . Toma  o  ministro da Fazenda ?  Sim , toma . Toma o  ministro da  República  ? Sim , toma . Toma o ministro do Estado ? Sim , toma . ( … ) e faltando a justiça punitiva para expelir os  humores nocivos e a distributiva para  alentar e alimentar o sujeito ,sangrando por  outra parte os  tributos em todas  as veias ,milagre é que não tenha  expirado ‘ .

Em outro trecho igualmente  célebre do mesmo  sermão ,Vieira afirmava  que no Brasil“ conjugam  por todos os modos o verbo ‘ rapio ‘ , porque  furtam por todos  os  modos  da arte , não  falando  em  outros  novos  e  esquisitos “ . Críticos  de  hoje que têm o vezo de de atirar todas as  nossas mazelas à conta da  herança portuguesa  costumam citar ainda a  carta de Pero Vaz de Caminha , na qual ,em meio às novidades da descoberta ,o escriba teria encaixado um  pedido  de emprego  para  um  parente . Ao  peculato denunciado  por  Vieira , soma - se o  nepotismo presente no primeiro documento de  nossa história . 

Há em tudo isso  boa dose de inexatidão . Ao afirmar que o verbo  ‘ rapio ‘ se conjugava no Brasil em  “ todos  os  modos “ ,  Vieira estava apenas adaptando para a  nossa  terra  uma figura  de  retórica já  utilizada  por  São  Francisco  Xavier  em  carta  ao  rei  dom  João III  descrevendo  o  estado a  que haviam  chegado  as  colônias  portuguesas  na  Índia  .O fenômeno , aliás , nada tinha de exclusivo de  Portugal e seu  império .O  filósofo Edmund  Burke , referindo - se a Warren  Hastings , um dos  fundadores do  Império Britânico , que governou por 13 anos a  Província de Bengala , diria que ele era  “ não apenas um ladrão da coisa pública , mas o  organizador  geral da  roubalheira , o  chefe da quadrilha “ .

ESCÂNDALO 

Quanto ao  recado de  Pero Vaz de Caminha a  dom Manuel , o Venturoso , não se referia  à possibilidade de um emprego para um parente , como se tornou hábito de afirmar , mas era uma  súplica para que fosse perdoada a  pena de degredo na Ilha de  São Tomé que afligia seu genro, Jorge de Osório , já condenado por extorquir o  abade de Rio Mocinhos . Caso  se  tratasse  real-mente de pedido de emprego ,nada haveria  a estranhar .Como lembra Dauril Alden em Burocracia e Sociedade no Brasil Colonial ,a frase  “ algum cargo da Justiça ou do do Tesouro “ era a resposta usual para qualquer requerente que apresentasse  folha de serviços digna de recompensa .Tais  cargos não eram somente dados a candidatos  em  perspectiva , mas também oferecidos a viúvas  ou órfãos como  dote . O mesmo ocorria no resto da Europa .

Dado o desconto para o que era próprio do tempo,no entanto,é de se convir que o Império Português, em geral , e o Brasil  Colônia , em particular , ofereciam terrenos  dos mais  propícios para o  vicejar da  corrupção . Mesmo o desencantado leitor dos dias de hoje não poderá evitar um arquear de sobrancelhas ao verificar a  infinidade de negociatas já praticadas  naquela  época , tais  como  se  encontram  minuciosamente  descritas  no  grande clássico da  língua : A primeira edição dessa obra trazia o nome do padre Vieira,como autor e a indicação de ter sido composta na tipografia Elviizirena, de Amsterdã, em 1652. Na verdade ,essa edição é de oura data ,foi composta em Lisboa e seu autor não é Vieira . Seria , talvez , Tomé  Pinheiro  da Veiga  ou Francisco Manoel  de Mello  ou , ainda , como sugerem alguns , Antônio de Sousa de Macedo .


Não importa .O embuste do autor e dos editores não impede que as personagens do livro ,continuem gritantes de realidade . Por  trás do nome arcaico dos  almotacés - encarregados de vigiar  “ padeiras , regateiras , estalagens e tavernas para ver se vendem cousas por seu preço  deixam  passar  por  estimação  de  anil  o  pacote  que tem  cheio de basares “ ? Já  naquele  tempo , havia  o  escândalo  dos ministros que enriqueciam vertiginosamente ,especialistas no tráfico de influências ,concorrências públicas fraudadas . 

Fonte  -  Jornal  O  ESTADO  DE  SÃO  PAULO  - pág  18  -  CORRUPÇÃO Data   -  Domingo , 24  de  Março  de  1991  -  PEDRO  CAVALCANTI 

( o texto abaixo é continuação deste )


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